Diário de uma mãe

Não sei se é uma preocupação de todos os  pais que os filhos tenham acesso a uma boa educação, para que o futuro seja risonho e possam ter as melhores opções de vida. Há quarenta anos atrás ainda era comum os pais não serem licenciados, mas havia já uma consciência mais ou menos generalizada que se os filhos avançassem até ao ensino superior teriam melhores oportunidades no mercado de trabalho. A sociedade também avançou nesse sentido, com os sucessivos avanços tecnológicos, com o aumento da escolaridade obrigatória e com uma maior oferta e competitividade. Hoje em dia, há uma oferta muito maior de bens, serviços e também de oportunidades. Não precisamos sair de casa para quase nada, a interconectividade e a globalidade permitem-nos obter tudo o que precisamos. Esta inércia de movimento leva claramente a um estado de apatia perante os grandes desafios da vida, porque não há esforço, nem compromisso, nem entrega, é tudo demasiado fácil e dado como adquirido. Penso que é normal projectarmos nos nossos filhos os nossos desejos reprimidos, as nossas ambições ocultas, e com isso querermos que eles conquistem em parte o que não conquistámos. A ideia da superação é positiva, porque também nos devemos superar a nós próprios a todo o instante. No entanto, muitas vezes, mais do que as que seria desejável, projectamos nos nossos filhos os nossos medos, as nossas angústias e as nossas fraquezas, porque não queremos que tenham as dificuldades que nós tivemos ou ainda temos. É por isso que nos dia de hoje temos esta ideia de que têm de aprender muitas línguas e começar cedo, porque não podem ficar para trás. Preenchemos o tempo de brincadeira e o verdadeiro lazer com mil e uma actividades que são fundamentais, a nosso ver, para moldar a personalidade deles, para lhes dar competências que lhes vão fazer falta no futuro. Ouço muitos pais dizerem-me que os filhos vão praticar futebol, porque é um desporto colectivo e é muito importante trabalhar essa competência, e eu questiono duas coisas, por um lado, onde fica a liberdade das crianças se organizarem em grupos de interesses comuns e trabalharem também a competência da iniciativa, da autonomia e da criatividade, por outro lado, porque é que deixámos de ouvir o que as crianças têm para nos dizer e lhes impomos as nossas vontades, que só estão certas na nossa geração, quando eles estiverem no nosso papel o mundo mudou uma e outra vez e o que realmente importa não terá muito que ver com o que nos preocupa actualmente. Somos pais zelosos, interessados e participativos, pois mesmo quando não temos tempo para ir andar de bicicleta, para fazer uma caminhada, para ler histórias, levamo-los às actividades, oferecemos presentes e esforçamo-nos para que aos 10 anos de idade já sejam conhecedores de uma boa parte do mundo. Esquecemo-nos muitas vezes do que realmente os faz feliz.

Jan 26, 2025 - 18:43
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Diário de uma mãe

Não sei se é uma preocupação de todos os  pais que os filhos tenham acesso a uma boa educação, para que o futuro seja risonho e possam ter as melhores opções de vida. Há quarenta anos atrás ainda era comum os pais não serem licenciados, mas havia já uma consciência mais ou menos generalizada que se os filhos avançassem até ao ensino superior teriam melhores oportunidades no mercado de trabalho. A sociedade também avançou nesse sentido, com os sucessivos avanços tecnológicos, com o aumento da escolaridade obrigatória e com uma maior oferta e competitividade.

Hoje em dia, há uma oferta muito maior de bens, serviços e também de oportunidades. Não precisamos sair de casa para quase nada, a interconectividade e a globalidade permitem-nos obter tudo o que precisamos.

Esta inércia de movimento leva claramente a um estado de apatia perante os grandes desafios da vida, porque não há esforço, nem compromisso, nem entrega, é tudo demasiado fácil e dado como adquirido.

Penso que é normal projectarmos nos nossos filhos os nossos desejos reprimidos, as nossas ambições ocultas, e com isso querermos que eles conquistem em parte o que não conquistámos. A ideia da superação é positiva, porque também nos devemos superar a nós próprios a todo o instante. No entanto, muitas vezes, mais do que as que seria desejável, projectamos nos nossos filhos os nossos medos, as nossas angústias e as nossas fraquezas, porque não queremos que tenham as dificuldades que nós tivemos ou ainda temos. É por isso que nos dia de hoje temos esta ideia de que têm de aprender muitas línguas e começar cedo, porque não podem ficar para trás. Preenchemos o tempo de brincadeira e o verdadeiro lazer com mil e uma actividades que são fundamentais, a nosso ver, para moldar a personalidade deles, para lhes dar competências que lhes vão fazer falta no futuro. Ouço muitos pais dizerem-me que os filhos vão praticar futebol, porque é um desporto colectivo e é muito importante trabalhar essa competência, e eu questiono duas coisas, por um lado, onde fica a liberdade das crianças se organizarem em grupos de interesses comuns e trabalharem também a competência da iniciativa, da autonomia e da criatividade, por outro lado, porque é que deixámos de ouvir o que as crianças têm para nos dizer e lhes impomos as nossas vontades, que só estão certas na nossa geração, quando eles estiverem no nosso papel o mundo mudou uma e outra vez e o que realmente importa não terá muito que ver com o que nos preocupa actualmente.

Somos pais zelosos, interessados e participativos, pois mesmo quando não temos tempo para ir andar de bicicleta, para fazer uma caminhada, para ler histórias, levamo-los às actividades, oferecemos presentes e esforçamo-nos para que aos 10 anos de idade já sejam conhecedores de uma boa parte do mundo. Esquecemo-nos muitas vezes do que realmente os faz feliz.