Distâncias cósmicas: as supernovas que ajudam a medir o Universo

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Fev 5, 2025 - 21:23
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Distâncias cósmicas: as supernovas que ajudam a medir o Universo

É impressionante a genialidade e engenhosidade com que a humanidade desenvolve seu conhecimento. Há alguns poucos séculos o nosso Cosmos estava limitado às esferas de cristal que regiam a dança dos planetas e das estrelas no céu. Hoje sabemos que o Universo é tão vasto que há estrelas cuja luz ainda não teve tempo de nos alcançar. Mas você já se perguntou como são medidas as distâncias cósmicas?

Desde a antiguidade, desenvolvemos técnicas engenhosas para medir as distâncias até os astros, a começar pelas mais curtas. A distância da Lua foi calculada há mais de 2 mil anos a partir da observação de eclipses lunares. Depois, medimos a distância até o Sol e os planetas pela paralaxe, triangulando a posição do astro a partir de dois locais distintos da Terra. Com a evolução dos telescópios foi possível medir a paralaxe de estrelas próximas observando elas em diferentes épocas do ano, com a Terra em posições distintas do Sistema Solar. E a cada técnica desenvolvida, a cada nova medida realizada, o Universo nos parecia ainda surpreendentemente vasto. 

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Há pouco mais de 100 anos, Henrietta Leavitt descobriu uma forma de medir distâncias intergalácticas. Seu estudo percebeu que a luminosidade das estrelas variáveis do tipo cefeidas estava diretamente relacionada com seus períodos de variação. Isso nos permitiu utilizar as cefeidas como “vela padrão” para determinar distâncias astronômicas. Se podemos calcular quanta luminosidade uma cefeida distante emite, podemos calcular sua distância comparando seu brilho observado aqui na Terra com o de outra cefeida cuja distância é conhecida. 

Usando essa técnica, Edwin Hubble calculou as distâncias de algumas nebulosas e descobriu que elas, na verdade, eram outras galáxias a milhões de anos-luz da Via-Láctea, o que o levou a concluir que o Universo era muito maior do que se pensava na época. O único problema é que, mesmo as mais luminosas cefeidas, são muito tênues para serem percebidas nas galáxias mais distantes. Para essas precisaríamos de uma vela padrão mais luminosa. Uma que brilhasse com a intensidade explosiva de uma supernova!

[ Edwin Hubble utilizou as variáveis cefeidas para medir a distância das galáxias – Imagem: NASA ]

Curiosamente, a pecinha que faltava neste quebra-cabeças já havia sido encontrada desde 1930, mas foi esquecida, no canto da sala, pela comunidade científica por várias décadas. Essa peça é o Limite de Chandrasekhar, do qual falamos na coluna anterior. O Limite de Chandrasekhar é um limite para a massa das anãs brancas, um corpo extremamente compacto, resultado do colapso de uma estrela de massa baixa a intermediária. Se uma anã branca atinge esse limite, ela colapsa ainda mais, gerando uma grande explosão e se transformando em uma estrela de nutrons ou em um buraco negro. 

Talvez se Subrahmanyan Chandrasekhar não fosse tão jovem, ou se tivesse escrito seu trabalho em uma universidade, sob a orientação de um professor, e não na cabine de um navio durante uma viagem, ou seja, se ele não fosse tão genial, talvez sua descoberta fosse mais bem aceita pelos cientistas mais experientes e conservadores. Talvez tivessem percebido mais cedo que algumas das explosões mais brilhantes do Universo ocorrem justamente quando uma anã branca ultrapassa o limite calculado por Chandrasekhar.

Quando uma anã branca em um sistema binário começa a “roubar” matéria de sua companheira, ela pode ultrapassar esse limite, que é de 1,44 massas solares. E quando isso acontece… boom! A anã branca explode em uma supernova do tipo Ia, iluminando o cosmos!

[ Como se forma uma supernova do tipo Ia – Créditos: NASA / ESA / A. Field ] 

As supernovas Ia são eventos raros e espetaculares. São tão brilhantes que podem ofuscar galáxias inteiras e ser vistas a bilhões de anos-luz de distância. Mas o que as torna especiais para a cosmologia é que, como essas explosões ocorrem sempre que uma anã branca atinge 1,44 massas solares,  todas as supernovas Ia explodem com praticamente a mesma massa e a mesma luminosidade máxima. Dessa forma, elas podem ser utilizadas como nossas velas padrão. Basta medir o brilho aparente de uma supernova Ia, para calcular sua distância com precisão, da mesma forma que fazemos com as Cefeidas, mas em escalas muito maiores!

Essa descoberta revolucionou a nossa capacidade de medir as distâncias no Universo. As supernovas Ia se tornaram degraus fundamentais na chamada “Escada de Distâncias Cósmicas”, uma série de métodos que nos permite medir distâncias cada vez maiores no universo. Enquanto as Cefeidas nos ajudam a medir distâncias dentro da nossa galáxia e de galáxias próximas, as supernovas Ia nos permitem alcançar as profundezas do cosmos, medindo distâncias de bilhões de anos-luz! É como se tivéssemos uma trena cósmica gigante, capaz de medir o próprio universo!

[ Anã branca, à esquerda, “roubando” massa da sua companheira gigante vermelha, à direita, em um processo que resultará uma explosão de supernova do tipo Ia – Créditos: NASA ]

Infelizmente, como essas explosões cósmicas são eventos raros e imprevisíveis, não somos nós que determinamos qual distância galáctica será medida. Precisamos estar de olho no Universo, detectando quando as supernovas Ia ocorrem para, a partir delas, medir as distâncias de suas galáxias. Não somos nós que revelamos as distâncias das galáxias mais distantes, apenas interpretamos as distâncias que se revelam para nós, através das supernovas Ia. 

E monitorar esses eventos cósmicos é um dos objetivos do observatório Vera Rubin e do telescópio espacial Nancy Grace Roman. A observação contínua de grandes áreas do céu permitirá a detecção de fenômenos raros, como as supernovas 1a, e com isso, ajudar a traçar um mapa cada vez mais preciso dos confins do Universo. 

[ Telescópio espacial Nancy Grace Roman deve ajudar a encontrar supernovas Ia no Universo – Créditos: NASA/GSFC ]

Juntamente com as variáveis cefeidas, as supernovas do tipo Ia são ferramentas poderosas para a cosmologia, e foram essenciais, por exemplo, para a descoberta da expansão acelerada do universo e da energia escura, a misteriosa força que a impulsiona. 

Ao longo da história, a criatividade humana tem sido fundamental em nossa jornada para desvendar os segredos do cosmos. Da engenhosidade dos antigos ao medir a distância da Lua, à genialidade de Leavitt e Chandrasekhar ao revelar novas ferramentas para a astronomia, cada descoberta expandiu os horizontes do nosso conhecimento e do próprio Universo. As supernovas do tipo Ia, embora representem o fim catastrófico de uma estrela, têm ajudado uma jovem civilização que habita este cantinho da Via Láctea, em sua jornada para compreender um pouco mais sobre a fascinante vastidão do Cosmos. —

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