PS Açores defende plano estrutural que envolva o Estado para evitar deportações nos EUA

O líder do PS Açores considera, em declarações ao Jornal Económico, que deve existir um esforço diplomático para reter essas pessoas nos Estados Unidos, lembrando que, na administração presidida por Barack Obama, se abriram processos para legalizar pessoas que não estavam documentadas.

Fev 6, 2025 - 08:27
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PS Açores defende plano estrutural que envolva o Estado para evitar deportações nos EUA

O líder do PS Açores, Francisco César, defende, em declarações ao Jornal Económico, que caso existam deportações da comunidade açoriana dos Estados Unidos, não é suficiente um plano de contingência, mas sim um plano estrutural, que comece com a ação do Governo português, no campo diplomático, de modo a que se evite essas mesmas deportações.

“Se isto acontecer [deportações de açorianos dos Estados Unidos] tem que ser um plano estrutural. Porque nós não estamos a falar de pouca gente. Nós podemos estar a falar até cinco mil agregados familiares. E portanto é um problema real e é um problema que vai afetar os Açores. E isso exige, a meu ver, em primeiro lugar, um trabalho ao nível da diplomacia”, afirma o dirigente socialista açoriano.

Refira-se que o Governo dos Açores anunciou que tinha um plano de contingência caso existissem deportações dos Estados Unidos, tendo em conta as ameaças do novo presidente Donald Trump, de deportar quem estivesse ilegal no território norte-americano.

Esse plano de contingência, como explicou o secretário regional das Comunidades e dos Assuntos Parlamentares, Paulo Estevão, à Rádio Renascença, incluía áreas como, por exemplo, a habitação e a saúde.

Cálculos do executivo açoriano apontam para a existência de 1,5 milhões de portugueses em território americano, com a “grande fatia” a serem provenientes do arquipélago.

Como avançou o Jornal Económico, esse plano incluía o envolvimento do Parlamento açoriano na elaboração desse plano de contingência, bem como a criação de um grupo de trabalho que inclui várias entidades públicas, privadas e da sociedade civil.

O líder do PS Açores considera que este plano mais profundo, para dar resposta a uma eventual vaga de deportações dos Estados Unidos, deve começar com a ação do Governo português.

“Devem existir esforços diplomáticos, no sentido de conversar com as autoridades americanas para que isso não aconteça”, considera Francisco César. “Por vários motivos, entre os quais o de se encontrarem bem inseridos na comunidade, por serem úteis para a comunidade, pelas relação de aliado que Portugal tem com o Governo dos Estados Unidos e, também, por a maior parte dessas pessoas serem açorianas. Os Estados Unidos têm também interesses na Região Autónoma dos Açores e o impacto social que isso pode vir a ter [as deportações] na região para os próprios [Estados Unidos]”, reforça o líder do PS Açores.

Francisco César confirmou que o PS vai chamar o secretário de Estado das Comunidades, José Cesário, ao Parlamento da República para falar exatamente sobre o assunto”, disse Francisco César.

Refira-se que José Cesário, bem como o ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, rejeitaram a possibilidade de, nesta fase, puderem existir deportações em massa de portugueses que estejam nos Estados Unidos, algo que foi criticado pela Associação de Migrantes Açorianos.

Plano deve incluir recepção das pessoas

No entender do dirigente socialista o plano deve conter também um plano de recepção das pessoas.

“As entidades americanas, se fizerem o repatriamento desses cidadãos, têm de avisar com antecedência as autoridades nacionais e em particular as autoridades regionais, para que possa ser preparada a sua chegada, o seu apoio, e a sua integração”, defende Francisco César.

Francisco César lembra que existem cidadãos que já nasceram nos Estados Unidos mas que nunca se legalizaram, existindo por isso o risco de enfrentarem a deportação.

“Não são só aqueles que foram, entretanto, para os Estados Unidos; há, efetivamente, um risco em relação às pessoas que já nasceram nos Estados Unidos, e que vivem há 20 anos nos Estados Unidos. Nós já vivemos esse ciclo no passado, com o governo presidido por Barack Obama a ter resolvido esse problema, ao dar acesso a essas pessoas a um programa especial para poderem ser americanos”, explica Francisco César.

O líder do PS Açores alerta também que, caso existam muitas pessoas deportadas dos Estados Unidos, é preciso ter noção de que, se esse número for elevado, o Governo dos Açores “não terá capacidade” de resposta.

“Essas pessoas são cidadãs portuguesas e portanto a resposta tem de ser não só das autoridades regionais mas também das autoridades nacionais. O plano de contingência tem de ser uma questão de Estado e não uma questão regional”, defende Francisco César.

PS disponível para dialogar com Governo dos Açores

Francisco César reforça que, face ao impacto social que as deportações podem vir a ter, é preciso que este assunto seja discutido com todos os partidos com assento parlamentar [nos Açores], “para que possa haver respostas, para que possa haver um consenso relação a esta matéria e que isso não seja uma matéria fraturante”.

O líder açoriano referiu que o PS está disponível para esse tipo de diálogo.

“Há matérias que são matérias de Estado ou matérias que têm a ver com os Açores e que ultrapassam a trica partidária. Não há para nós qualquer tipo de problema nesta matéria. Aliás, temos proposto exatamente isso. A única coisa que eu espero é que isto não seja como o vento que leva as palavras”, disse Francisco César.

Questionado (a 29 de janeiro) sobre se o PS já recebeu um contacto formal do Governo, tendo em conta que o plano de contingência do executivo açoriano incluía o contacto com o Parlamento dos Açores, Francisco César disse que “não”, sublinhando que o PS já falou diversas vezes sobre o assunto, mas que até agora “não teve qualquer tipo de resposta”.

Francisco César lembra que os Açores já tiveram experiência de repatriamento de cidadãos portugueses, e recorda o “enorme impacto” que isso teve.

“Teve impacto na comunidade e teve impacto, sobretudo, na vida das pessoas. A primeira preocupação que nós temos é na vida das pessoas, porque as pessoas estão inseridas no meio americano e na comunidade americana. E existe uma rede de apoio e uma estruturação, digamos, na sociedade americana, pela comunidade portuguesa muito forte. Por isso é que eu acho que, se isso acontecer, o plano não deve ser apenas regional, mas um plano em colaboração com o país, porque em primeiro lugar essas pessoas são cidadãos portugueses”, volta a afirmar Francisco César.

Questionado sobre se os Açores têm capacidade instalada, no caso de existirem deportações, em áreas como a habitação e saúde, o líder do PS diz que, neste momento, “nós não temos capacidade instalada”, no âmbito, por exemplo, de respostas habitacionais “para ninguém”.

Francisco César diz que, quer na Madeira quer nos Açores, quer no resto do país, neste momento, o mercado de habitação “não funciona”, adiantando que “há uma grande parte da população que está fora” e que, portanto, as pessoas “vão ter uma dificuldade acrescida”.

Mas mesmo perante este cenário, Francisco César considera que o país “tem que dar respostas” a estas pessoas.

Francisco César adianta também que a comunidade açoriana nos Estados Unidos tem “uma história muito grande” em terras norte-americanas, estando “bem inserida” no comércio, na vida social, e até na vida política.

“É uma comunidade que começou sobretudo como uma comunidade operária e que hoje já está totalmente inserida naquilo que é o modo americano de vida e que tem sucesso. E nós começamos a ver que, para além disso, para além de terem sucesso naquilo que é o seu trabalho, começa a ter impacto social, começa inclusive a desconcentrar-se do ponto de vista daquilo que é a sua localização, o que é um bom sinal. A comunidade portuguesa nos Estados Unidos e, também, a comunidade que está no Canadá é uma comunidade já com alguma história”, diz o líder do PS Açores.

“Estão perfeitamente inseridos. E, inclusive, são conhecidos pelo poder político como uma comunidade que funciona, digamos, como um bloco, que é trabalhada pelos poderes políticos americanos e que já tem, ela própria, a sua influência. É uma comunidade muito importante. Eu acho muito estranho que os políticos norte-americanos ainda não se tenham manifestado neste âmbito”, acrescenta Francisco César.

Francisco César reforça que a migração açoriana para os Estados já engloba duas, três gerações.

“A maior parte das pessoas estão legalizadas. Mas há muita gente que ainda não está”, refere o líder do PS Madeira.

Francisco César salienta que, em alguns casos, estamos a falar de Estados americanos que possuem “alguma importância política”, como por exemplo Boston, Nova Iorque e Rhode Island, considerando “importante” que nesses mesmos Estados exista “pressão política”, no sentido de reter essas pessoas no país.